Intolerância Religiosa

INTOLERÂNCIA RELIGIOSA
COMO FORMA DE DISCRIMINAÇÃO

A Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece, em seu art. 18, o direito à liberdade religiosa e de pensamento. Da mesma forma, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos determina, em seu artigo 18, que toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, podendo adotar uma religião ou crença de sua escolha. O Brasil é, ainda, Estado signatário da Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância

A Constituição Federal de 1988, por ser laica e indutora da cidadania plena, reconhece e preserva o direito de religiosos e não religiosos, de ateus, agnósticos, de entidades filosóficas humanísticas e dos povos tradicionais. Segundo o art. 19 da Constituição Federal de 1988, o Estado não deve estabelecer preferências ou privilégios em favor de uma religião em particular, mas deve garantir que todas possam conviver em igualdade, por meio do respeito às escolhas individuais, sem perseguições ou discriminações, devendo o espaço público ser assegurado para todos e todas. 

Apesar dessas garantias ao direito à liberdade religiosa, o percurso para a efetividade desse direito tem sido longo. Em 2005, um grupo de jovens judeus foi espancado em Porto Alegre. Em 2014, um aluno candomblecista de 12 anos, de uma escola pública da cidade do Rio de Janeiro, foi proibido pela professora de assistir a aula por usar guias. Em 2015, no Rio de Janeiro, uma menina candomblecista de 11 anos foi atingida por uma pedra na cabeça pelo simples fato de usar suas vestes religiosas. Ainda em 2015, uma muçulmana foi xingada e agredida com uma pedrada em São Paulo. No mesmo ano, uma mulher muçulmana foi agredida com uma cusparada no rosto e acusada de ser terrorista, em Nova Iguaçu. No ano de 2016, a Polícia Militar de Sergipe invadiu um terreiro de candomblé e apreendeu todos os instrumentos musicais, sob alegação de perturbação ao sossego. Em 2017, uma tenda de umbanda foi atacada com pedras e depois incendiada por racistas, em Campinas. Nesse mesmo ano, em Santa Luzia-MG, o Ministério Público estabeleceu normas e dias de funcionamento para um centro de umbanda na cidade, desrespeitando de forma dura a garantia da liberdade religiosa. Em 2018, uma sinagoga foi pichada e incendiada por antissemitas em Pelotas, Rio Grande do Sul. Em 2019, um terreiro de candomblé na Bahia foi atacado por racistas que rezavam junto ao muro do terreiro e diziam “Fora Satanás”, entre outras frases depreciativas (VILLELA, 2015). Esses são alguns casos violentos e criminosos que demonstram como o racismo religioso é um problema a ser combatido. 

O levantamento de dados da então Secretaria Especial de Políticas para a Promoção de Igualdade Racial (SEPIR), de 2011 a 2015, registrou uma elevação no que diz respeito aos casos de violência incitados por intolerância religiosa. Igualmente, segundo pesquisas realizadas em 2018 pela Secretaria Estadual de Direitos Humanos do Rio de Janeiro, o Estado do Rio de Janeiro sofreu um aumento de 56% nos casos de intolerância religiosa. Essa mesma investigação revela ainda que, em uma linearidade histórica, o candomblé e a umbanda continuam sendo as religiões mais perseguidas e atacadas de forma violenta, sendo, respectivamente, 30% dos casos contra pessoas do candomblé e 22% dos casos contra adeptos da umbanda (GANDRA, 2018). 

Esses registros revelam a extrema importância e necessidade da construção de políticas públicas e programas que sejam capazes de atender às demandas para o bem-estar social e para que o Estado cumpra seu papel na garantia da liberdade de crença e não crença. No Estado do Rio de Janeiro, em 2018, foi instituído o Estatuto Estadual da Liberdade Religiosa (Lei Estadual nº. 8.113/2018), abordando questões relativas à importância da liberdade de culto, a equidade de direitos das religiões e a necessidade de combate à intolerância religiosa no Estado do Rio de Janeiro. Ainda no Rio, uma Lei estadual de 2011 estabelece a criação de Delegacia Especializada em Investigar Crimes Raciais e Delitos de Intolerância Religiosa no Estado do Rio de Janeiro (Lei Estadual nº 5.931/2011), que, contudo, foi criada apenas em 2018.


VOCÊ SABIA?

A intolerância religiosa, atualmente no Brasil, pode ser tipificada como crime de racismo, segundo a Lei nº. 7.716/1989 (Lei Caó), em sua quarta versão, no Art. 140, § 3º, do Código Penal, e no Art. 208 da mesma legislação: Ofender alguém com xingamentos relativos à sua raça, cor, etnia, religião ou origem (Art. 140 do Código Penal (injúria), com a qualificadora do § 3º – Pena: um a três anos de reclusão) (CÓDIGO PENAL, art. 140). Essa Lei ficou conhecida também como Lei Caó, em homenagem ao autor Carlos Alberto de Oliveira. A legislação define como crime o ato de “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” (LEI CAÓ, art. 20). A Lei não só prevê multa e punição para o crime de racismo, como também tipifica o crime de racismo igualando à discriminação por religião (intolerância religiosa).

AÇÕES DE PRECONCEITO RELIGIOSO

CRIMES VIOLAÇÃO À LIBERDADE RELIGIOSA

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição Federal da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988.

BRASIL. Decreto-lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Brasília, DF, 1940. 

BRASIL. Decreto nº 10.932, de 10 de janeiro de 2022. Promulga a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, firmado pela República Federativa do Brasil, na Guatemala, em 5 de junho de 2013. Brasília, DF, 2022. 

BRASIL. Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989. Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. Brasília, DF, 1989. 

GANDRA, Alana. Casos de intolerância religiosa sobem 56% no estado do Rio. Site Agência Brasil, 08 mai. 2023. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-05/casos-de-intolerancia-religiosa-sobem-56-no-estado-do-rio?amp. Acesso em: 09 mar. 2023. 

VILLELA, Flávia. Muçulmanos estão entre as principais vítimas de intolerância religiosa no Rio. Site Agência Brasil, 22 ago. 2015. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2015-08/mulcumanos-estao-entre-principais-vitimas-de-intolerancia-religiosa?amp. Acesso em: 09 mar. 2023. 

SEPPIR BRASIL. Relatório sobre Intolerância e Violência Religiosa no Brasil (2011 – 2015): Resultados Preliminares. Disponível em: https://direito.mppr.mp.br/arquivos/File/RelatorioIntoleranciaViolenciaReligiosaBrasil.pdf>. Acesso em 09 mar 2023